O GRAVADOR DE VAVÁ
Há várias dias que reflito sobre a solidão...E na necessidade que as
pessoas sentem de alguém que se preocupe com elas, seja através de um
telefonema ou um simples SMS.E lembrei de Napoleão Brandão, o meu compadre Vavá
que com sua voz tonitruante cantava uma música, quando eu era criança, de
Vicente Celestino...O Ébrio.. e gostava também de cantar Porta Aberta..Muitas
vezes ás pessoas se veem no mundo sem família, sem um amigo, sem ter com quem
compartilhar uma alegria, um problema e precisam encontrar uma porta aberta...
E lembrando de Vavá
mergulhei mais nas lembranças e me vejo menininha,admirando as serestas, as
vozes bonitas os instrumentos bem tocados...Ele um inveterado boêmio,amava uma
boa farra onde podia dar vazão aos sentimentos de um artista que só se realiza
fazendo o que gosta...Um luar, um violão e uma boa bebida para refrescar a
garganta.
Certo dia ele entrou em casa e nos mostrou um gravador... Fiquei impressionada.
Queria gravar, ouvir minha voz nas poesias que declamava e me pus a declamar A
Louca de Albano. Mãe Tina queria cantar também a sua Súplica...Cosete também
soltou a sua voz, cantando Saudade.. Canção de Amo.E entre toda aquela alegria
ele nos mostrou uma fita que havia gravado na casa de D. Virginia .
D. Virginia Rego era uma senhora de uma educação esmerada, devoradora de
romances, principalmente os de M. Delly e que apreciava as coisas boas da vida.Dona
de um hotel recebia todos os seus hóspedes como se fossem amigos de longa data
ou parentes muito próximos.Gostava de tocar violão e receber os seus amigos
seresteiros.S.Edson Matias não perdia a ocasião de compartilhar esses bons
momentos, mesmo contando com as dificuldades de deixar a sua cidade.Caboclinho
que dividia o seu tempo entre seus afazeres no Jacarezinho, em São Brás e com a
família em Penedo e também era possuidor de uma voz encantadora e João de
Santa, comerciante em nossa cidade, com seu estabelecimento no Beco dos Machado
e que gostava tanto de música, que na hora que não havia movimento se punha a
tocar o seu cavaquinho.
E nos pusemos a ouvir a fita.A princípio era o cavaquinho de João de
Santa, pai do nosso amigo Érico Abreu, acompanhado pelos acordes maviosos do
violão de caboclinho, tocando uma música de Waldir Azevedo. Depois começaram a
tocar uma música, muito tocada nas rádios interpretada por Ângela Maria e uma
voz amiga se fez ouvir; era uma música que falava:
Essa
noite eu chorei tanto
Sozinha sem um bem
De amor todo mundo chora
Eu porém vivo sozinha
Muito triste sem ninguém
Será
que sou feia?
Não, não, não...
Não, não, não...
Então eu sou linda?
- Você é um amor.
Responda
então por que razão
Eu vivo só sem ter um bem?
- Você tem o destino da lua
que a todos encanta e não é de ninguém.
Ao cantar à penúltima estrofe da música a cantora improvisada perguntou:
“ Será que eu sou feia”? Só que o meu compadre Vavá, inteligente e espirituoso
como só ele sabia ser, ao ouvir o queixume da cantora respondeu de imediato :
-Você é um horror...
O nome de nossa amiga, que é uma pessoa maravilhosa e envolvente não
me cabe revelar... Nem as paredes, confesso...
2 comentários:
As músicas de Vicente Celestino e Ângela Maria são verdadeiramente parte da trilha sonora de minha tenra infância, Márcia. Excelente registro. Valeu.
Simplesmente ARRETADO!!!!
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