domingo, 11 de agosto de 2013

                 O circo, um sonho de infância



    Quando criança fomos privilegiados com pais que valorizavam a cultura, ora adquirida através dos livros que meu pai trazia de suas viagens, ora dos filmes que assistíamos no Cine Pax,ou da boa música tocada por minha mãe ao piano.O teatro, fazia parte dos nossos passeios nas férias além dos folguedos culturais e das historinhas contadas e recontadas por nossas avós.


    Para crianças interioranas os divertimentos eram simples, mas vivíamos a nossa infância com a intensidade de quem quer aproveitar os momentos de lazer e aproveitávamos todas as oportunidades que nos surgia: ora a festa do Padroeiro da cidade, o Coração de Jesus, onde as noites ricas de entretenimentos ao cargo dos noiteiros e dos participantes que se esmeravam em dar o seu melhor; ora as festas escolares que se revestiam do caráter cívico e solene.


   A chegada de um circo na cidade era uma festa. Não só o chamamento dos palhaços, mas toda a preparação que entretia a cidade e não só as crianças. Nunca íamos às estreias.O nosso pai ia só, ver se o circo era de acordo com os bons costumes e normas de decência.As nossas expectativas cresciam e povoavam o nosso imaginário nas noites cálidas de Pão de Açúcar.No dia seguinte, no grupo em que estudávamos os comentários fervilhavam e sempre havia aqueles coleguinhas cujos pais permitiam o seu acesso na estreia.


   E com renovado respeito e inquietação adentrávamos na noite escolhida no mundo maravilhoso do circo. E havia os palhaços, irreverentes e brincalhões, os mágicos a fazer desaparecer uma moça bonita, os malabaristas, as cantoras de rumba e danças exóticas, e o melhor as acrobatas e equilibristas. E eu vendo aquele mundo rodeado de magia e luz me imaginava andando na corda bamba. Como eu sonhava... Não queria ser Iracema, a filha de um dos donos do circo, que foi armado na Praça São Pedro, e arrebatou os corações dos jovens casadouros. Não... eu queria fazer acrobacias...E durante muitos dias, mesmo depois que o circo ia embora, eu ficava a sonhar acordada com todas as manobras radicais dos balanços e cordas.




    O último circo que fui pelas mãos do meu pai foi o Tihany, armado ao lado do Trapichão em Maceió. Jogo de luzes em um bailado inesquecível, animais adestrados, globo da morte, malabaristas, palhaços e mágicos. O circo era belíssimo. Foi uma noite linda e encantada... Uma noite que acabou de repente e não mais se repetiu, pois logo depois meu pai fez sua última viagem.


    Não fui  mais assistir a nenhum espetáculo circense.Como ir sem meu pai?Como ir sem as suas advertências e olhares admirados?


     Quando o meu filho nasceu, certa vez o levei novamente ao circo Tihany. Mas, toda aquela magia dos espetáculos assistidos com o meu pai havia acabado. O mundo do circo havia acabado para mim.


    Domingo passado, superada as minhas saudades, fui com meu filho, assistir ao Circo do Marcos Frota. E voltei a ser criança entrando naquele picadeiro, como se fosse um local sagrado. As emoções me dominaram e me vi envolvida por todas aquelas memórias da menininha que queria ser trapezista. As lágrimas jorraram... Como explicar o que estava sentindo ao ver aquelas crianças ginastas e os palhaços que provocavam risos sem contar piadas com duplo sentido. Senti-me envolvida por aquelas garotas a fazer sua apresentação em tecidos que desciam do teto e as envolviam como nuvens, e me vi a ter medo do mágico, que no caso era uma mulher que usava as facas com precisão. E aplaudindo a tudo, feliz, esquecida que lá fora, a escuridão ia de novo me envolver e pensar que gostaria de estar me equilibrando naqueles trapézios voadores.


    A oração de Marcos Frota, nos levou a acreditar que os sonhos podem sim ser realizados e ele deixou o mundo da telinha para uma tela maior, que é o mundo do circo, onde trabalha com geração de crianças carentes.


    Hoje, quero agradecer ao meu pai Jurandir Gomes por haver me proporcionado uma infância povoada de poesia e ao meu filho Jurandir Amadeu por haver me devolvido a alegria de ser criança outra vez.Sou sim, uma artista...No circo da vida estou a me equilibrar numa eterna corda bamba...

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